segunda-feira, 13 de julho de 2009

Sábado, 11 de julho (aproximadamente 70 milhões de anos atrás) – Terça-feira. Domingo, 12 de julho de 1967 – Quarta-Feira.


Digerindo. Ficando nu.

Chave na fechadura. Já não está mais emperrada...

Luz na cara. Frio no corpo e mal-estar. A câmera já estava ligada, mas tocavam duas músicas ao mesmo tempo. Eu sozinho dentro de casa com o frio da rua a me incomodar. Mas um libertino veio me libertar. Era um anjo do mal que só fazia o bem. (Câmera lenta na viagem para receber o calor da rua.)

Ar quente de bons sentimentos. Pista lotada. Dança multicolorida e psicodelia em preto e azul. Tudo acontecia. Nada acontecia. Saí voando. Flutuava. Tudo ao nível do chão. Ao nível do super-vão que estava abaixo de todos. Foi nesse que todo mundo caiu. Vi aquilo e decidi cair também. Me joguei onde todo mundo se jogava e tudo ficou mais azul. O branco se tornava mais azul e psicodélico. A câmera não parava de se mover. Os Libertines tocavam bem alto no meu ouvido da direita, enquanto o New Order sintetizava o da esquerda. A câmera girava até a metade da sala e voltava para cobrir a outra metade. As roupas se molhavam exaurindo a falta de vida.

Pessoas importavam demais. Mulheres não importavam. Homens não importavam. Importante mesmo eram as pessoas. Umas estranhas. Muitos amigos e... Quase todas estranhas. Elas me olhavam com caras de quem achava normal ver um bêbado numa festa. Mas eu não estava bêbado! Era tudo um aprendizado. O cérebro decidia alguma coisa e vinha alguém e abria a minha cabeça para arrancar a idéia de lá. O malfeitor devolveu o meu asco contra ele com um abraço que pareceu um soco na cara da minha consciência. Ele devolveu uma das coisas...

Perdi tudo naquela noite. Ganhei uma das coisas mais maravilhosas da minha vida. Eu finalmente percebi que não sei nada. Percebi que tenho preconceitos, tenho pouca credibilidade, tenho poucas boas idéias de verdade, tenho pouco conhecimento musical, tenho algemas que me impedem de flutuar pelo mundo. Mas finalmente vi um videoclipe de dentro. Aquilo tudo era um videoclipe que tratava de uma vida inteira na idade da pedra, na Era dos Dinossauros. Nós éramos os dinossauros que usavam as raízes que saíam dos dentes para se fixar no terreno e nas pessoas. Andávamos em carros movidos com os pés e com a força animal. Com a nossa força.

Já hoje a tecnologia está mais adiantada. O Brasil já trocou de nome. Agora se chama Brazil. Cheguei na década de 60 nessa tarde. Peguei um jipe com os amigos e fui comemorar a vida. Outro videoclipe. Antes havia rodado um sobre uma bandinha de adolescentes. Ontem locações mais caras me levaram para o Rio de janeiro. Mas hoje vivi no Woodstock genuíno dos anos 60 e seu amor pelo rock. O vocalista confirmou... Eu já sabia que ele comentaria do ano, li sobre isso mês passado num almanaque dos melhores eventos dos anos 60 em Porto Alegre. Naquela época aconteciam uns eventos culturais sensacionais, com mostra de filmes e tudo mais. Na mostra de 67 eu vi “Alguém está Batendo na Porta”. Baita filme doido. Drogas, sexo, adolescentes... Videoclipe de banda de rock de verdade.

Mas eu descobri a viagem toda. Olhei na programação do cinema. Em 2009 esse filme foi exibido, mas era só uma reprise. Eu sabia... Estamos nos anos 60, vivendo os 15 minutos pós morte. A vida passa na minha frente. Assim como aconteceu nos 15 minutos anteriores. E nos outros... Nunca vivi. Só no infinito... Vivi enquanto estou morto muito mais do que quem acha que anda vivo por aí.

Isso não foi pela festa, pelo show, pelo filme. Tudo começou com uma mordida e terminou com um nascimento... Transei perigosamente com a vida e tudo terminou com a porta aberta atrás de mim. Eu morri. E parece que então entendi a vida.

Um comentário:

  1. tchê, isso aqui ficou demais "Nunca vivi. Só no infinito... Vivi enquanto estou morto muito mais do que quem acha que anda vivo por aí".
    e o lance da transa com a vida.. eu escrevi sobre isso em um texto também. mas a transa nao me matava, me deixava mais viva.
    teu fluxo de pensamentos é ótimo!

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